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domingo, 22 de dezembro de 2019

Aula de História – política, economia, ideologia e ética profissional


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A aula é um espaço político em que o professor tem protagonismo. Por isso a questão relacionada ao discurso político do professor, durante as aulas, é muito antiga. Dentro ou fora de regimes autoritários o problema tem aparecido com grande frequência, em todas as épocas, no mundo todo. Naturalmente que algumas disciplinas são mais expostas ao problema do que outras. Mas, qual é mesmo o problema?
Na antiguidade grega alguns filósofos criaram um estilo de ensino que, com Aristóteles, ganhou a denominação de Escola Peripatética. Um mestre, seguido de seus discípulos, deslocava-se através de campos e de cidades. Os ensinamentos tinham como base coisas encontradas pelos caminhos trilhados. Foi devido a uma dessas aulas que Sócrates, mestre de um desses grupos, foi condenado à morte. A condenação aconteceu devido a afirmações que hoje sabemos serem ideias perfeitamente aceitáveis. Mas que incomodaram aos poderosos de seu tempo.
Se recorrermos aos evangelhos encontraremos os primos João Baptista e Jesus de Nazaré sendo condenados, em situações diferentes, por coisas que diziam a seus discípulos. Os seguidores deles os respeitavam como professores e bebiam de seus ensinamentos.
Desde aqueles tempos remotos até a atualidade encontramos exemplos de professores sendo punidos pelo que disseram a seus alunos ou discípulos.
Todos nós tivemos professores que assumiram posicionamento político-partidário ou ideológico durante alguma aula. Por vezes um ou outro resolveu fazer comentários e análises do momento político ou econômico. Seria esse o problema?
Vamos desenvolver um pouco mais a ideia.
O que é indesejável?
É natural para disciplinas como Geografia, Sociologia, Filosofia e História a utilização de exemplos do cotidiano para ilustrar ideias e conceitos que devem ser apresentados em aula.
Não há neutralidade. Somos o que pensamos. O professor acredita em coisas e seu comportamento está relacionado ao que pensa e defende. No entanto, precisamos lidar profissionalmente com adolescentes. Isso exige cuidados éticos importantíssimos.
Já testemunhei casos em que professores introduziam conceitos religiosos em aula. Em outras situações vi um ou outro arriscar até mesmo puxar uma oração do “Pai Nosso” em aula, em situações específicas, acreditando que essa seja comum a todos. Mas se houver um estudante ateu, judeu, muçulmano ou budista naquele ambiente? O mesmo raciocínio devemos aplicar ao destaque a candidatos em eleições, partidos políticos, correntes ideológicas, religiões ou filosofias de que porventura sejamos seguidores. Esta é uma questão ética da qual o professor jamais pode abrir mão. Para evitar problemas é importante se preparar com antecedência: plano de aula, preparação de exercícios e demais atividades.
Tratar de religião só se o tema pedir. Por exemplo, Movimento Reformador Religioso. John Huss, MartinhoLutero, João Calvino e Henrique VIII são personagens que remetem a correlações com o presente. Entretanto, os cuidados devem ser redobrados. Não podemos deixar que nossas crenças apareçam a ponto de incomodar a qualquer pessoa que seja seguidora de qualquer das correntes religiosas resultantes dos movimentos reformadores ou dos não cristãos. Nós simplesmente não temos direito. Mas temos o dever de dar acesso a essas informações e conhecimentos.
Se o espaço de tempo para falar de questões do cotidiano, usado pelo professor, se alongar excessivamente pode criar resistências. O primeiro problema acontecerá antes de alguma reação que possa vir de fora do espaço das aulas. Ocorre que a aula tenderá a ficar chata. Uma parte dos estudantes pode até acompanhar bem devido as suas características e interesses individuais. Mas a maioria se deixará levar à dispersão.
As possíveis reações de pais e da direção da instituição de ensino virão se algum estudante se sentir incomodado. O que não é incomum. Essas situações são abundantes no magistério do ensino básico.

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O que é desejável?
A aula de História deve visitar o presente, mas não pode residir nele.
A Grécia Antiga e a origem da ideia de democracia remetem inevitavelmente à atualidade. É importante para o adolescente aprender as relações entre o passado, a atualidade e as transformações sofridas pelo conceito de democracia.
Não podemos deixar de apresentar exemplos variados de práticas democráticas em países diversos. Se usarmos apenas como exemplo o que se exerce no Brasil, tenderemos a nos mostrar parciais. Isso não parecerá muito educativo para os estudantes que, por serem bastante jovens, costumam expor as impressões deixadas pela aula a seus familiares. Isso pode ser fonte de grandes problemas.
D. Pedro I é um personagem que causa muitas curiosidades aos jovens. O processo histórico em que ele é destaque é riquíssimo em correlações com a atualidade. A maioria delas pode ser bem usada. Mas devemos ter cuidado quando tocarmos em temas sensíveis como a sexualidade do primeiro imperador do Brasil. Poderemos ser mau compreendidos ou alguns de nossos preconceitos serem expostos e criticados.  Entretanto, as movimentações políticas de D. Pedro I devem ser exploradas em aula e vão levar à ampliação dos horizontes políticos dos jovens estudantes. Ter cuidado não significa evitar os temas.
Evidentemente que as fases mais próximas do momento atual exigem ainda maiores cuidados. Qualquer que seja a temática central da aula as correlações com política e economia atuais serão muito pertinentes. Desde que não percamos o foco da questão central. As citações de atualidades não podem ser mais do que acessórios ou detalhes. Se a aula estiver acontecendo em época de eleições os cuidados devem ser redobrados.
Acima de tudo, é nosso dever profissional apresentar os conceitos, temas e informações. Mas em todos os casos, precisamos deixar espaço para que o jovem encontre as suas próprias conclusões. – Podem ser diferentes das nossas e mesmo assim estarem usando corretamente as informações acadêmicas recebidas, eles têm todo direito a isso.
Não podemos confundir cuidado ético com covardia. Temos que ter coragem de dar o instrumental conceitual e factual, de base acadêmica, necessário a que o jovem se desenvolva intelectualmente e aprenda a entender o passado como algo visceralmente ligado ao presente. As conclusões que cada um desenvolverá deve ser exercício livre. A capacidade de leitura crítica da realidade é desejável, mas pode se apresentar com interpretações diferentes da que o professor tem. Isso deve ser entendido como natural. Talvez covardia mesmo seja fazer proselitismo com estudantes de treze ou quatorze anos.